RESCISÃO POR ACORDO ENTRE AS PARTES

RESCISÃO POR ACORDO ENTRE AS PARTES

Conceito, verbas rescisórias, FGTS, seguro-desemprego, estabilidade, recontratação, eSocial

 

1. INTRODUÇÃO

No período anterior à reforma dos direitos trabalhistas, constituía prática recorrente das empresas o acordo verbal com o empregado para rescisão sem justa causa do contrato de trabalho com a respectiva devolução da multa rescisória do FGTS. A finalidade desse acordo era a diminuição dos custos das verbas rescisórias a serem pagas pelo empregador e a possibilidade de o empregado receber o benefício do seguro-desemprego.

Essa prática, embora recorrente, não tinha respaldo legal e sujeitava ao empregador eventuais prejuízos em casos de reclamatória ou fiscalização trabalhista.

Em vista disso, com a publicação da Reforma Trabalhista (Lei n° 13.467/2017), foi acrescentado à CLTartigo 484-A, o qual possibilita a rescisão do contrato de trabalho por acordo entre as partes, com a finalidade de coibir práticas como aquelas realizadas pelo empregador.

Com isso em mente, a presente matéria se pauta a respeito da rescisão por acordo entre as partes, abordando os detalhes acerca desse tipo de rescisão.

2. CONCEITO DE RESCISÃO POR ACORDO

artigo 484-A da CLT dispõe da possibilidade de as partes definirem a rescisão do contrato de trabalho, com a flexibilização das verbas rescisórias a serem pagas pelo empregador.

Nesse sentido, como o próprio nome já menciona, trata-se de um tipo de rescisão originada no acordo entre empregado e empregador, os quais formalizarão uma minuta e estipularão as condições da rescisão do contrato de trabalho.

2.1. Possibilidade de acordo com o tipo de contrato

A rescisão do contrato de trabalho por acordo entre as partes, pautada no artigo 484-A da CLT, pode ser aplicada ao contrato indeterminado, intermitente ou determinado com cláusula assecuratória de direito recíproco.

Quanto aos demais contratos por prazo determinado que não possuem a referida cláusula, há divergência de entendimentos sobre essa possibilidade:

Primeiro entendimentoEm um primeiro momento, há quem entenda que seria possível a aplicação da modalidade de rescisão contratual por acordo entre as partes em razão de que o artigo 484-A da CLT não restringiu a sua aplicação apenas aos contratados indeterminados. Por isso, seria aplicada aos contratos determinados, ainda que não possuíssem cláusula assecuratória de direito recíproco.
Segundo entendimentoEm um segundo momento, inclina-se para a impossibilidade de aplicação desse instituto de rescisão aos contratos determinados, tendo em vista que a redação do artigo 484-Ainciso I da CLT faz menção ao pagamento pela metade do “aviso prévio, se indenizado”. Dessa forma, considerando que não há aviso prévio para o contrato por prazo determinado, não haveria que se falar em rescisão por acordo.

Nesse sentido, diante da inexistência de consenso dos entendimentos, fica a critério do empregador optar por algum desses entendimentos.

É importante observar que, caso opte pelo primeiro entendimento (vide quadro acima), o empregador deve se atentar às verbas rescisórias devidas, uma vez que, nesses tipos de contrato, não haverá aviso prévio, por exemplo.

Além disso, esse tipo de rescisão possui verbas rescisórias específicas e não estão condicionadas a quem solicitou a rescisão por acordo, ou seja, independentemente de quem solicitou a rescisão por acordo, se foi o empregado ou o empregador, as verbas rescisórias permanecerão as mesmas, conforme se verá no decorrer da presente matéria.

Para compreensão da diferença entre rescisão por acordo legal e rescisão por acordo fraudulento, é necessário observar o quesito temporal:

- período anterior à Reforma Trabalhista (antes da vigência da Lei n° 13.467/2017); e

- período posterior à Reforma Trabalhista (após a vigência da Lei n° 13.467/2017).

No período anterior à Reforma Trabalhista, assim conceituada a Lei n° 13.467/2017, constituía prática recorrente das empresas a rescisão do contrato de trabalho sem justa causa, condicionando ao empregado o ônus da devolução dos valores depositados na conta vinculada ao FGTS a título de multa rescisória (40% do FGTS). À época, essa atitude já era considerada prática ilegal, porém era comum a ocorrência de situações como essa.

Após a Reforma Trabalhista, isto é, depois da entrada em vigor da Lei n° 13.467/2017, com a intenção de evitar práticas como as mencionadas, o legislador acrescentou à CLTartigo 484-A, o qual possibilitou a rescisão por acordo entre as partes, influindo diretamente nas verbas rescisórias a serem pagas para beneficiar o empregado e o empregador.

2.3. Benefícios para o empregador e para o empregado

As vantagens desse tipo de rescisão serão tanto para o empregador quanto para o empregado:

Para o empregadorA vantagem está na redução de algumas verbas rescisórias, como aviso prévio e multa do FGTS, o que faria integralmente, caso tenha optado por uma rescisão sem justa causa do contrato de trabalho.
Para o empregadoA vantagem está no aumento das verbas rescisórias em comparação ao que poderia receber em caso de pedido de demissão, ou seja, o empregado poderá receber aviso prévio indenizado, quando acordado, e multa do FGTS, o que não aconteceria se tivesse pedido demissão.

3. VERBAS RESCISÓRIAS

No que diz respeito às verbas rescisórias, são devidos:

- saldo de salário;

- aviso prévio (se trabalhado, integral; se indenizado, pela metade);

- 13° salário proporcional (gratificação natalina);

- férias proporcionais com o respectivo adicional de férias (1/3);

- férias integrais não gozadas, com o respectivo adicional de férias (1/3), se houver (apenas para contratos superiores a um ano);

- FGTS – multa de 20% (GRRF);

- FGTS – depósito do mês anterior e do mês da rescisão (GRRF);

- saque do FGTS – limitado a 80%; e

- salário-família, se houver.

Alguns detalhes a respeito de algumas dessas verbas devem ser observados e serão demonstrados nos subtópicos seguintes.

3.1. Aviso prévio e aviso prévio proporcional

Como mencionado no subtópico anterior, caso seja definido entre as partes que o aviso prévio será indenizado, o empregador indenizará o aviso prévio normal (30 dias) pela metade, isto é, será indenizado por 15 dias. Por outro lado, caso optem pelo aviso prévio trabalhado, o empregado trabalhará em sua integralidade, ou seja, os 30 dias.

No entanto, muito se questiona a respeito do aviso prévio proporcional e da sua aplicabilidade na modalidade de rescisão por acordo.

Como se sabe, o artigo 1° da Lei n° 12.506/11 dispõe a respeito do aviso prévio proporcional, o qual consiste no acréscimo de três dias de aviso prévio para cada ano de trabalho. Todavia, a referida lei é omissa quanto às modalidades de rescisão em que serão acrescidos os respectivos dias de aviso prévio.

Dessa forma, diante da omissão legislativa, formaram-se duas correntes de entendimentos, a saber:

Primeira correnteInclina-se para o entendimento de que o aviso prévio proporcional se aplica à rescisão do contrato de trabalho por mútuo acordo, desde que seja na forma indenizada e pela metade (isto é, o aviso prévio normal e o acréscimo de três dias para cada ano, ambos pela metade).
Segunda correnteEntende que, por se tratar de rescisão por acordo entre as partes, não caberá o acréscimo da proporcionalidade, quer seja ele indenizado ou trabalhado.

Assim, de forma preventiva, observando os princípios in dubio pro operario (em caso de dúvida, deve-se beneficiar o empregado) e o da norma mais favorável ao empregado, orienta-se que seja observado o entendimento da primeira corrente apontado acima, segundo o qual, quando o aviso prévio for indenizado pela metade ou trabalhado, seja indenizado, também, do aviso prévio proporcional pela metade.

Dessa maneira, não se abre margem para questionamento em reclamatória trabalhista, uma vez que foi adotada a condição mais benéfica ao empregado.

3.1.2. Redução do aviso prévio

Nos termos do artigo 488, caput da CLT, por ocasião da existência de rescisão sem justa causa motivada pelo empregador, o horário normal de trabalho do empregado durante o prazo do aviso será reduzido de duas horas diárias, sem prejuízo do salário integral.

Além disso, o parágrafo único do mesmo dispositivo estabelece que é facultado ao empregado trabalhar sem a redução das duas horas, em substituição à redução do aviso prévio por sete dias corridos ao final.

Nesse sentido, da análise dos dispositivos, pode-se observar que a redução da jornada será aplicada aos casos em que houver dispensa sem justa causa e, portanto, não se aplica para os casos de rescisão por mútuo acordo, de modo que, caso o aviso prévio tenha sido definido de forma trabalhada, o empregado deverá cumpri-lo em sua integralidade.

3.2. Multa do FGTS

De acordo com o artigo 18§ 1° da Lei n° 8.036/90, havendo rescisão sem justa causa do contrato de trabalho, o empregador ficará obrigado a depositar na conta do FGTS do empregado o percentual de 40% de todos os depósitos realizados durante a vigência do contrato.

No entanto, em se tratando de rescisão por acordo entre as partes, o valor da referida multa será reduzido pela metade, isto é, para 20%, conforme a previsão contida no artigo 484-Ainciso Ialínea “b” da CLT.

3.3. Multa da data-base

artigo 9° da Lei n° 7.238/84, bem como o artigo 9° da Lei n° 6.708/79, dispõe a respeito do pagamento de multa em favor do empregado em caso de rescisão sem justa causa ocorrida no período de 30 dias que antecedem à data-base da categoria.

Da análise da redação dos dispositivos mencionados acima, ambos fazem menção à rescisão sem justa causa motivada pelo empregador, como se pode observar:

Lei n° 6.708/79Lei n° 7.238/84
Art. 9° O empregado dispensado, sem justa causa, no período de 30 (trinta) dias que antecede a data de sua correção salarial terá direito à indenização adicional equivalente a um salário mensal, seja ele, ou não, optante pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.Art. 9° O empregado dispensado, sem justa causa, no período de 30 (trinta) dias que antecede a data de sua correção salarial, terá direito à indenização adicional equivalente a 1 (um) salário mensal, seja ele optante ou não pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS.

Nesse sentido, portanto, havendo rescisão por acordo entre as partes, ainda que ocorra nos 30 dias que antecedem à data-base da categoria, não será devida a multa em favor do empregado.

Todavia, o mesmo não se pode dizer com relação à situação em que o último dia do aviso, trabalhado ou indenizado, for após a data-base da categoria, de modo que também não haverá a multa, mas o empregado terá, de qualquer forma, direito aos reajustes salariais.

Isso acontece, porque o aviso prévio indenizado projeta o contrato de trabalho para todos os direitos trabalhistas do empregado (Súmula 371 do TST). Além disso, é entendimento sumulado do TST que o período de aviso prévio indenizado será considerado para efeito da incidência ou não da multa da data-base (Súmula 182 do TST).

Nessa linha de raciocínio, portanto, caso as partes definam que o aviso prévio será indenizado, na hipótese de o último dia da projeção do aviso recair após a data-base da categoria, o empregado terá direito aos reajustes salariais.

3.4. Salário-família

O salário-família é um direito constitucional conferido ao empregado de baixa renda, de acordo com o artigo 7°inciso XII da Constituição Federal (CF/88), sendo regulamentado pela Lei n° 8.213/91, pela Instrução Normativa PRES/INSS n° 128/2022 e pelo Decreto n° 3.048/99.

Trata-se de benefício que não está condicionado ao tipo de rescisão, mas sim à existência de filhos de até 14 anos e à remuneração do empregado (artigos 6570 da Lei n° 8.213/91Portaria Interministerial MPS/MF n° 026/23).

Dessa forma, portanto, o salário-família também contempla o mês da rescisão, ainda que ela tenha sido formalizada mediante acordo entre as partes.

Nota-se, por fim, que, na competência de rescisão, o valor do salário-família poderá ser proporcional aos dias trabalhados, conforme o artigo 4°§ 4° da Portaria Interministerial MPS/MF n° 026/23.

4. MOVIMENTAÇÃO DA CONTA DO FGTS

Nos termos do artigo 484-A§ 1° da CLT, o empregado poderá movimentar na modalidade de rescisão por acordo até 80% do seu FGTS.

Dessa forma, diferente do que ocorre com uma rescisão sem justa causa, o empregado, na rescisão por acordo entre as partes, não sacará o saldo do FGTS depositado na conta vinculada do empregado de forma integral.

Portanto, havendo a movimentação de 80% da conta vinculada do empregado, restará um saldo de 20% do FGTS, que poderá ser sacado nas mesmas condições dispostas no artigo 20 da Lei n° 8.036/90.

5. SEGURO-DESEMPREGO

Em se tratando de rescisão por acordo entre as partes, o empregado não terá direito ao recebimento do benefício do seguro-desemprego, conforme o artigo 484-A§ 2° da CLT, pois o princípio básico do benefício do seguro-desemprego é o desemprego involuntário. Assim, com a formalização do acordo de rescisão, o caráter da involuntariedade não se configurará.

6. EMPREGADO DOMÉSTICO

Não há previsão na Lei Complementar n° 150/2015 a respeito da aplicação da rescisão por mútuo acordo entre as partes.

Todavia, o artigo 19 da LC n° 150/2015 estabelece que, não havendo previsão específica nas leis mencionadas por ele, em casos omissos, serão aplicadas subsidiariamente as normas da CLT.

Dessa forma, observa-se que não há impedimento para aplicação da rescisão por mútuo acordo nos contratos de trabalho do doméstico. Tanto é assim que o MOS para o Empregador Doméstico - versão de 02.08.2023 dispõe que poderão ser utilizados os seguintes motivos de desligamento:

Como se pode observar, o motivo 33 se refere à rescisão por acordo entre as partes. Além disso, nesse tipo de rescisão, como mencionado no Subtópico 3.2 acima, a multa do FGTS é devida pela metade.

Por essa razão, haja vista que o trabalhador efetuará o saque de apenas metade do valor da multa, o empregador doméstico pode comparecer à agência da Caixa Econômica Federal e solicitar que seja liberada a outra metade dos valores depositados.

7. ESTABILIDADE

A estabilidade é a garantia de emprego, pautada na impossibilidade de o empregador promover a rescisão sem justa causa do contrato de trabalho.

Na legislação, há diversas hipóteses de estabilidades conferidas aos empregados, entre as quais convém mencionar as seguintes:

HipóteseBase legal
Empregada gestanteArtigo 10inciso IIalínea “b” dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da CF/88Súmula 244 TST
Empregado vítima de acidente de trabalhoArtigo 118 da Lei n° 8.213/91Súmula 378 do TST
Empregado membro eleito para CIPAArtigo 10inciso IIalínea “a” dos ADCT
Serviço militarArtigo 472 da CLTartigo 60 da Lei n° 4.375/64

Havendo qualquer uma das hipóteses de estabilidade mencionadas acima, muito se questiona a respeito da possibilidade de se promover a rescisão por acordo entre o empregador e o empregado estável.

A esse respeito, há dois entendimentos:

Primeiro entendimentoInclina-se para a impossibilidade de rescisão por acordo, ao fundamento de que a legislação permite apenas o pedido de demissão quando formalizado, de acordo com as diretrizes do artigo 500 da CLT.
Segundo entendimentoPor outro lado, há quem entenda pela possibilidade de rescisão por acordo do contrato de trabalho do empregado estável, desde que com a assistência do sindicato da categoria ou da Secretaria do Trabalho ou da Justiça do Trabalho, uma vez que esse tipo de rescisão é mais benéfico ao empregado, no que diz respeito às verbas trabalhistas devidas.

Por essa razão, diante da inexistência de um consenso e de respaldo legal específico, caso o empregador e o empregado detentor de estabilidade pretendam realizar uma rescisão por acordo, o correto é verificar previamente com o sindicato da categoria e com o Ministério do Trabalho, para se evitar percalços futuros.

8. RECONTRATAÇÃO

Há questionamentos recorrentes a respeito da recontratação do emprego cujo primeiro contrato tenha sido rescindido por acordo entre a empresa e o empregado.

Nessa situação, ainda que o contrato anterior tenha sido rescindido por acordo, para efetiva recontratação do empregado, é necessário o decurso do prazo de 90 dias da rescisão anterior, já que a rescisão por acordo é motivo para que o empregado possa movimentar a conta do FGTS. Assim, a recontratação, antes do decurso do prazo acima, será entendida como manobra fraudulenta para permitir a movimentação do FGTS por parte do empregado.

Logo, caso não seja observado o prazo de 90 dias, a rescisão será considerada fraudulenta, conforme o artigo 312 da Portaria MTP n° 671/2021 e o artigo 9° da CLT.

9. MODELO DE DOCUMENTO DE RESCISÃO POR ACORDO ENTRE AS PARTES

Com vistas a auxiliar na elaboração de minuta de acordo de rescisão, indica-se acesso ao seguinte modelo:

Atenção: trata-se de modelo, o qual deverá, então, ser adequado ao caso concreto.

10. SEFIP

No SEFIP, a informação relativa ao desligamento em decorrência de acordo entre as partes será mencionada com os seguintes códigos:

SEFIPMovimentação: código I5
Saque: código 07

Além disso, o recolhimento da multa do FGTS de 20% será mediante o pagamento da GRRF emitida através do Conectividade Social.

11. ESOCIAL

Havendo rescisão por acordo entre as partes, a informação será evidenciada no evento S-2299 no eSocial, com motivo de desligamento com código “33 - Rescisão por acordo entre as partes (art. 484-A da CLT)”, conforme o MOS - V. S-1.1 (Consol. até a NO S-1.1 - 08.2023) - Publicada em 18.10.2023 e a Tabela 19 do eSocial.

As verbas rescisórias serão mencionadas no evento S-1200, as quais serão pagas no prazo de dez dias do término do contrato, conforme o artigo 477§ 6° da CLT.

Por outro lado, em relação ao doméstico, não há uma tratativa diferente, sobretudo porque o MOS para o Empregador Doméstico - versão de 02.08.2023 não dispõe de passo a passo específico para rescisão por acordo, o que não será diferente em relação às demais formas, exceto quanto ao motivo de desligamento.

Assim, o empregador doméstico informará o evento de desligamento com o indicativo “33 - Rescisão por acordo entre as partes (art. 484-A da CLT)” e procederá com as informações de aviso prévio, quer seja ele trabalhado ou indenizado, conforme o acordo realizado entre as partes.